29 de setembro de 2009

Diferenças


Olha só que interessante: em 1980, num censo em que as pessoas podiam escolher abertamente "qual a sua cor" apareceram 136 definições diferentes! Entre elas:

acastanhada
branca morena
morena bem chegada
pouco clara
puxa para branca

A vida dos brasileiros definitivamente não é como a dos americanos para quem, como bem definiu Caetano Veloso 

branco é branco, preto é preto 
(E a mulata não é a tal) 
Bicha é bicha, macho é macho, 
Mulher é mulher e dinheiro é dinheir
o

Parte da maleabilidade brasileira tem a ver com formas próprias de navegar socialmente. Não admitimos que somos racistas mas nossos retratos nem sempre revelam aquela boa e velha imagem de um país de democracia racial. Pelo contrário, processos tão interessantes são muitas vezes, violentos. 



“Acho que todos os negros sofrem com o racismo; eu que sou branco, também sofro com tamanha ignorância” 

Ronaldo Nazario 


28 de setembro de 2009

27 de setembro de 2009

24 de setembro de 2009

APROXIMAÇÕES URBANAS

Entender a vida na cidade de São Paulo requer ampliação do olhar. Requer ir além de Paris, Nova Iorque e Londres. Deixar de ter a cabeça na Europa ou Estados Unidos e a bunda no Brasil.
Entender a vida em São Paulo requer pensar na apropriação informal do espaço, muito mais do que na formalidade de universos urbanos nos quais a fronteira entre o que é público eo que é privado está claramente definida. Requer que pensemos na experiência de cidades como Lagos e México DF; na forma como as pessoas ali moram e circulam, como lidam com tecnologia e serviços, água, esgoto, lixo e trânsito. Talvez ainda tenhamos muito a aprender com semelhanças que gostamos de ignorar.

22 de setembro de 2009

ANTROPOLOGIA

"A antropologia tem como projeto formular uma idéia de humanidade construída pelas diferenças, resultado do contraste dos nossos conceitos (teóricos ou de senso comum) com outros conceitos nativos" Mariza Peirano

15 de setembro de 2009

Celular em Moçambique

Foto: Maíra Bühler, Moçambique, 2009.

Para continuar a pensar sobre sentidos locais da tecnologia: Para que ela usa o seu celular?  Sobre o que está falando? Sobre peixe? Sobre família? Sobre a concorrência? Sobre o dia de amanhã? Com o namorado? Com a mãe? Com a amiga? Muito tempo? Pouco tempo? Em que língua? Por que agora e não depois? Desde quando? Com amor? Com ódio? Com indiferença? Com saudades? 
Qual o sentido do celular na sua vida? 

9 de setembro de 2009

Blogueiros da alimentação

Extra, extra! Mais um convite.
Desde o final dos anos 2000 a internet foi inundada por uma nova possibilidade de comunicação cotidiana e autoral: os blogs. Espécies de diários virtuais, os blogs rapidamente se tornaram uma ferramenta de exposição do cotidiano daquele que escreve, transformando a intimidade e a vida privada muitas vezes no assunto central dos relatos. Divididos em temas especiais, como quadrinhos, literatura ou moda, os blogs viraram mania mundial e colocaram gente muito diferente em rede, contatados sempre por um assunto comum, entre eles a culinária.
A idéia desse encontro é discutir quais são as práticas e as relações estabelecidas virtualmente por meio da troca de receitas, dicas e críticas aos restaurantes.

23 de agosto de 2009

dinheiro vivo


Você sabia que no Brasil 55% da população economicamente ativa recebe salário e faz pagamentos em dinheiro vivo? E que no Nordeste essa parcela sobe para 70%? E que dois terços das compras ou contas pagas acima de R$ 500,00  são feitas em espécie?
O Brasil vai muito além das grandes cidades e ainda devem ter muitos colchões por esse mundo afora.

21 de agosto de 2009

A regra escrita, a regra falada, a regra vivida

Proibido fumar; não estacione; respeite o silêncio. Desde crianças somos ensinados a ler e respeitar as regras escritas, espalhadas pelo cotidiano e inseridas nas nossas vidas.

Outras são ditas o tempo todo, mas não são absolutas e nem válidas universalmente: não falar de boca cheia, respeitar os mais velhos, comer a salada antes da refeição quente e rezar antes de dormir mostram como cada grupo carrega suas regras particulares e se diferencia por meio delas.

Mais difícil é perceber as regras que não estão escritas e que nunca são ditas, pois que são códigos vividos com tanta naturalidade que nem parecem regras: cumprimentos, acenos, expressões de afeto e de desagrado.

Por isso é sempre bom ter cuidado ao andar por mundos desconhecidos; sem querer podemos pisar em terreno proibido e, certamente, não entender a piada.

16 de agosto de 2009

Farinha pouca, meu pirão primeiro.


Fazendo um levantamento de ditos populares para uma nova pesquisa, não há como não notar que a maior parte deles traz consigo uma referência culinária. Quer ver?

Rapadura é doce, mas não é mole não.
É tudo farinha do mesmo saco.
Panela velha é que faz comida boa.
Comer o pão que o diabo amassou.
Estar por cima da carne seca.
Está mais perdido que cebola em salada de frutas.
Quem conta com a panela alheia, arrisca-se a ficar sem ceia.
Vingança é prato que se come frio.
Comer com os olhos.

Um povo que se expressa pela comida é um povo que pensa sobre comida, ainda que sem querer.

14 de julho de 2009

Debates gastronômicos

Culinária, gastronomia e alimentação deixaram de ser apenas assuntos restritos à cozinha.
Cada vez mais filósofos, antropólogos, sociólogos e cientistas de todos os tipos têm se dedicado a estudar e debater questões que antes eram restritas apenas aos cozinheiros e chefs de plantão. Basta ver a quantidade de novos livros nas prateleiras das livrarias ou reparar no grande número de programas de TV sobre o mesmo tema para entender a relevância de produzir pensamento crítico sobre o que comemos.
Aqui, uma resenha fresquinha sobre dois livros recém publicados, mostrando que este debate está apenas começando!
http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/3096,1.shl

30 de junho de 2009

Soho no Transport

Eram duas mulheres transpirando no Transport, equipamento que promete queimar 500 calorias em uma hora. Vestidas com roupas tecnológicas, grife aparente, ambas carregavam grossas alianças douradas nas mãos, fazendo questão de mostrar que eram casadas. Elas falavam, como falam todas as mulheres, até mesmo quando estão se exercitando. E uma delas disse:

- Eu vou passar o dia inteiro no Soho. Vou chegar de manhã e só vou sair à noite.

A antropóloga, que escuta a conversa atentamente enquanto queima suas próprias calorias, começa a pensar nas razões profundas que levam uma mulher a querer passar o dia inteiro num cabeleireiro. Seria insegurança? Vaidade? Falta de amor próprio? Demonstração de status? Quando está quase chegando a uma conclusão sobre o assunto, o diálogo entre as duas mulheres é retomado:

- E (arfando) no dia seguinte, eu vou passear no Central Park.

A antropóloga respira aliviada. Apesar de falarmos a mesma língua nem sempre (ainda bem!) nos entendemos.

Como derrubar certezas e inquietar pensamentos

Um curso novo.
Para quem quer aprender a ver o mundo a partir de outros pontos de vista.

http://www.espm.br/inovacao/curso_como_derrubar_certezas_e_inquietar_pensamentos.asp

21 de junho de 2009

cultura e tecnologia

Foto: Maíra Santi Bühler, Nigéria, maio de 2009.


Quem disse que é preciso escolher entre viver plenamente sua cultura e usufruir tecnologia de ponta? Os objetos que escolhemos para nos relacionar com o mundo nem sempre têm o mesmo valor e o mesmo significado para todas as outras pessoas. As coisas só fazem sentido dentro de um contexto: culturas diferentes, significados diferentes.

antropologia é preciso



Toda essa história da mulher que virou homem, que virou mulher de novo - por dentro - para ter filhos porque sua mulher não podia gerar, nos faz pensar algo que para antropologia é fundamental: a idéia de gênero é socialmente construída e não naturalmente dada.
Ser mulher no Brasil é diferente de ser mulher na Melanésia, que é diferente de ser mulher na França, que é certamente diferente de ser mulher no Irã ou entre os índios Tapirapé. Cada dia mais nos convencemos de que para compreender o mundo dos outros, antropologia é preciso.

10 de junho de 2009

Mulher moderna?

Ela não sabia como se classificar e nem queria saber. Classificações não faziam sentido para ela. Há de se ter cuidado com os rótulos, sempre. Mas sim, ela tinha 30 anos, um filho, um emprego, um marido, um apartamento na zona oeste de São Paulo e se achava uma mulher moderna.

Naquela manhã de quarta-feira, enquanto o bebê brincava, ela falava e arrumava a cama. Com uma mão enfiava o lençol debaixo do colchão, com a outra repetia a ação cotidiana de impedir catástrofes na vida do filho - a criança tinha acabado de aprender a andar.
Os dois, mãe e menininho, viviam ali a cena cotidiana da ausência do pai que saía mais cedo e chegava mais tarde. Mas era um pai participativo: trocava fraldas, levava para passear, dava banho, dava comida... quando estava por perto. Naqueles dias nos demos conta do que significa ser um pai participativo: significa ajudar, quando dá.

A vida era uma correria: de manhã ela deixava o menino na casa da sua mãe, dava suas aulas de inglês, voltava correndo, almoçava correndo, levava o menino de volta para casa, recebia a sogra que chegava para ajudar, saía, dava mais aulas, voltava para casa, preparava o jantar, o menino chorava, a sogra falava compulsivamente, o menino dormia e só aí o marido chegava.
Mulher moderna? E ela dizia que, pensando bem, se tivesse que escolher entre ser mulher moderna e ter filhos, ela preferia ter filhos. E que se você pensar bem, mulher moderna é como todas as outras, vive equilibrando pratinhos para dar conta de tudo. Para ela, assim como para tantas outras, mulher moderna é a mulher tradicional, só que com dupla jornada. Mulher moderna são todas as mulheres, com todos os anseios de ser independente e ter vida profissional, mais todos os anseios de ser esposa e de ser mãe, mais todas as sogras e todas as mães e todas as babás para ajudar a segurar a onda...

maçãs são boas para pensar



Há muitas formas de se pensar e agir sobre maçã, sobre um tomate, sobre temperos e especiarias. Uma maçã, por exemplo, pode virar um suculento strudel; pode se transformar em compota se acrescida de açúcar, pode virar um purê servido com prato salgado, pode ser comida pura, mordida, raspada ou transformada em suco. Isso quer dizer que uma maçã nunca é apenas uma maçã, assim como uma comida não é somente uma comida. 

Por trás de uma aparente combinação de ingredientes está escondida uma estrutura social, que classifica o alimento em algo comestível - ou não - , que estabelece regras relativas ao seu uso - lavar, cortar, descascar, fritar ou comer cru - outras relacionadas ao seu valor simbólico fe outras, relacionadas ao entorno da cozinha - comer à mesa, em pé, acompanhado, sozinho, em casa, na rua etc.

Por isso um antropólogo sempre dirá que não comemos simplesmente comida; ao comer estamos afirmando certas escolhas e classificações que podem ajudar a revelar formas diferentes de ver e entender o mundo. Fazer uma observação atenta sobre a comida e os processos culinários de pessoas diferentes é também fazer uma etnografia de como as sociedades observam e classificam os sentidos humanos. Gosto, paladar e cheiro deixam de ser entendidos apenas como reações orgânicas e adquirem um sentido cultural, revelando um conjunto de conhecimentos úteis para captar e ordenar e entender o mundo em que vivemos.

8 de junho de 2009

Maria


Ela se pergunta se o seu cabelo fica bom assim. Ela desafio o crespo, ela desafia as cores, ela se quer loira. Ela vai no salão uma vez por semana porque, hoje em dia, ela já não é mais aquela mulher de antigamente. Ela se olha no espelho, se sente bonita e leve.


Os filhos dela cresceram e ela ganhou liberdade e vontade de viver. Ela começou a trabalhar, ganhou independência e, hoje, quem vai proibir uma mulher independente de sair sozinha? Ela ensinou para eles o que é bom e o que é ruim. Eles aprenderam que podem fazer tudo na vida. Só não podem matar, roubar e fumar droga.

Ela sonha em comprar um carro e dirigir, em ter um neto e em ter saúde, ela pede a Deus que Ele lhe dê jeito de viver tranqüila.

28 de maio de 2009

Brinquedos


Academia de Ginástica, segunda feira de manhã. Um dia normal, os frequentadores com suas preocupações habituais: correr contra o pedaço de pizza, os chopinhos do final de semana, a caipirinha de saquê com frutas vermelhas. Em meio aos corpos suados e às calças colantes, mães chegam com sacolas, crianças e babás. Uma, em especial, vive um pequeno desafio cotidiano: Como fazer o menino parar de chorar? O bebê vai de um colo ao outro. Grita, bate as mãozinhas, puxa o cabelo da babá. A mãe, quando não lhe resta mais opção, enfia a mão na sua grande bolsa milagrosa. Imaginamos a bola, a chupeta, o ursinho ou o chocalho que vai sair dali. Mas não: ela tira um iPhone e dá na mãozinha do bebê. Ele leva o aparelho à boca e faz-se o silêncio. Mães nem sempre se guiam pela razão.